Quando pensamos ou ouvimos a frase “só quero ter uma vida normal”, temos a impressão de que é um desejo simples, que qualquer pessoa pode alcançar sem esforço. Algo como: se é simples, é fácil de conseguir.
Mas não é bem assim que acontece. Esse normal tem um tanto de regras que precisam ser cumpridas e se entende que todas as pessoas chegarão ao mesmo ponto, que a vida será uma linha reta previsível e segura.
E então, vem a vida com seus acontecimentos imprevisíveis. De repente, já não é possível atingir esse normal. A pessoa que antes acreditava na certeza de uma vida linear, no objetivo a ser alcançado porque se esforçou e merecia, agora se vê vítima de uma grande sensação de impotência. Sente-se incapaz de se reorganizar para continuar, sem encontrar sentido, acreditando que não fez o suficiente, que não é boa o suficiente, que todo mundo consegue, menos ela.
Geralmente, é aqui que a terapia começa. Claro, não precisa começar nesse ponto, mas, muitas vezes, é nesse momento que a pessoa procura ajuda. E aqui neste texto, vou colocar algumas perguntas para pensarmos sobre essa ideia de “serei feliz quando atingir a vida que todo mundo tem”.
O que é esse normal?
A primeira pergunta seria: o que é normal para você? Isso porque a ideia de normalidade é extremamente subjetiva. Para alguns, pode ser ter um emprego estável, uma família estruturada e uma rotina previsível. Para outros, pode significar liberdade, experiências intensas e uma vida sem amarras. O que você considera normal pode ser estranho para outra pessoa, e vice-versa.
Só de lembrar que existem muitos “normais”, é possível perceber que esperar alcançar um padrão específico não é necessariamente o melhor caminho a seguir. Mas continuemos no questionamento.
Quem falou que isso é normal?
Essa questão é muito importante porque vai mostrar de onde vem a ideia de que é só atingindo determinados padrões que se está autorizado a ser feliz.
Na terapia psicanalítica, valorizamos cada memória e cada fala que você trouxer a esse respeito, pois nem sempre isso está claro e consciente.
Além disso, é possível que você se depare com emoções e sentimentos conflitantes que podem ser difíceis de acessar, como questões familiares, por exemplo.
Por que você quer ser normal?
Talvez a pergunta mais importante seja essa: por que você deseja tanto ser normal? O que você acredita que vai encontrar ao se encaixar nesse padrão?
Muitas vezes, queremos ser “normais” porque acreditamos que isso trará aceitação, segurança e pertencimento. Mas essa busca vai muito além disso. Ela revela quais regras internas estamos obedecendo — quase sempre de maneira inconsciente.
Percebe que nesse desejo de uma vida normal existem muito mais camadas do que podemos supor ao olhar de forma superficial?
Somos assim, nós, seres humanos: complexos, com uma psique cheia de camadas que traz para o presente conteúdos internalizados de tempos que a consciência, sozinha, não consegue alcançar. Talvez porque não estávamos prontos para lidar com certas situações, talvez porque precisamos de vínculos e espaços seguros para acessar questões mais profundas, traumáticas ou simplesmente desconfortáveis.
Para isso, a psicanálise está aqui: para proporcionar uma escuta atenta e sem julgamentos, ajudando a reorganizar esses conteúdos internos de forma que o indivíduo consiga dar conta de si mesmo e se reinventar sempre que for necessário.
No final das contas, a vida que importa é aquela que você consegue lidar e onde você se movimenta sendo quem é, com todas as suas características.